O Ministério Público Federal
(MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) enviaram manifestação à Justiça
Federal nessa terça-feira (2) em que voltam a pedir decisão imediata (liminar)
que determine a suspensão do comércio e demais atividades e serviços não
essenciais em todo o estado do Pará.
Ufra não garantiu segurança
da flexibilização – DPU e MPF destacam que um dos estudos que o governo
paraense considerou para decidir pela redução do isolamento em nenhum momento
recomenda essa reabertura. Pelo contrário: inclui itens importantes que
aparentemente não foram considerados pelo estado. Denominado Redes Neurais
Artificiais e Modelagem Matemática nas Previsões Epidemiológicas para os Casos
de Infecção por Covid-19, o estudo da Universidade Federal do Pará (Ufra)
adverte que “a subnotificação de casos e óbitos altera a realidade da pesquisa,
devendo haver o reprocessamento constante dos dados”. O estudo também registra
que “o avanço da pandemia para o interior do estado, somado à taxa de adesão da
população às medidas de combate ao vírus, influenciará a projeção do tempo de
duração da pandemia”.
No entanto, segundo o
Covid-19 Analytics, modelo estatístico desenvolvido por professores da
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/Rio), a taxa de
contágio no Pará está em 2,77 novos contaminados para cada pessoa infectada, ou
em 1,55, conforme estudo do Núcleo de Medicina Tropical da Universidade Federal
do Pará (UFPA), relatam MPF e DPU.
Outros dois critérios-base
estabelecidos pela OMS para a definição do momento ideal de flexibilização das
normas de distanciamento social são a garantia de que o sistema de saúde
consegue lidar com o ressurgimento de casos da doença que pode ocorrer após a
redução do isolamento, e a certeza que o sistema de vigilância em saúde pública
é capaz de detectar e gerenciar os casos e seus contatos, e identificar
ressurgimento de casos.
De acordo com o MPF e a DPU,
os documentos utilizados pelo governo do Pará para decidir pela flexibilização
– o relatório técnico da Ufra e a nota técnica da Secretaria de Estado de Saúde
Pública (Sespa) – também não comprovam o preenchimento desses dois outros
critérios. “Na verdade, os dados disponibilizados pelo próprio estado
demonstram que ainda nos encontramos em situação crítica na ocupação de leitos
de UTI, uma vez que no estado inteiro, atualmente, 87,21% de leitos de UTI
exclusivos para covid-19 estão ocupados”, reforçam os signatários da
manifestação, ressaltando que esses são níveis “alarmantes”.
Sobre a capacidade de
detecção e gerenciamento de novos casos pelo
sistema de vigilância em saúde pública, outro critério previsto pela
OMS, MPF e DPU constatam que os casos dificilmente são detectados e
acompanhados a tempo. “Na verdade, a subnotificação é tamanha que,
recentemente, em 28 de maio, foram divulgados, de uma única vez pelo estado do
Pará, impressionantes 15 mil casos e quase mil óbitos que se encontravam
subnotificados”, exemplificam.
Outros fatores não
considerados pelo estado – MPF e DPU complementam as informações enviadas à
Justiça Federal com outros fatores não considerados nos estudos apresentados
pelo governo do estado e que, segundo os procuradores da República e defensores
públicos federais, demonstram ser precipitado falar em estabilização e, pior
ainda, em redução da taxa de contágio. Um deles é a subnotificação de casos e
mortes, o que fragiliza os dados utilizados pelos modelos matemáticos que
preveem a disseminação da doença. “Há
muito mais mortes por covid-19 no dia de hoje do que parecem revelar os dados
oficiais, haja vista a demora na testagem e na divulgação de seus resultados.
Isso significa que qualquer análise feita com dados de hoje ou dos últimos dias
está sujeita a altíssimo grau de erro”, frisam.
Os membros do MPF e da DPU ressaltam
que o número real de casos e mortes pela doença pode ser pelo menos sete vezes
maior que os números contabilizados oficialmente conforme estudos de
pesquisadores da Ufra, UFPA, Universidade de São Paulo (USP), Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe), Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE).
A manifestação da DPU e do
MPF cita entrevista divulgada em 28 de maio, em que uma das responsáveis pelo
modelo matemático utilizado no estudo apresentado pelo estado, a professora da
Ufra Evelin Cardoso, diz que “sem os números verdadeiros da epidemia, a tomada
de decisões por parte das autoridades é feita baseada em um cenário que não
reflete a situação real”.
Sobre a chamada “imunidade
de rebanho”, MPF e DPU citam avaliação
feita por professor infectologista da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) Unaí Tupinambás. Segundo ele, essa estratégia geraria enorme custo em
vidas humanas, e o melhor caminho a seguir é manter o isolamento e achatar a
curva epidêmica.
Em relação às informações
divulgadas pela Sespa, o MPF e a DPU registram que a secretaria passou a adotar
metodologia confusa, informando os casos e óbitos que teriam ocorrido nas
“últimas 24 horas” e, em separado, os casos e óbitos que teriam ocorrido em
dias anteriores, por causa da
subnotificação e do não envio de dados pelas prefeituras. Além disso, a
Sespa fracionou os boletins em um único dia, divulgando mais de um, e de forma
não cumulativa.
Essa forma de divulgação dos
dados acaba dando a errônea impressão ao público de diminuição do número de
casos, criticam procuradores da República e defensores públicos federais, que
analisaram dia a dia os casos divulgados entre 20 e 28 de maio e calcularam que
houve dias em que o número de casos quadruplicou, e o número de mortos dobrou,
na comparação com o dia anterior.
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