ENTREVISTA NO SITE DA VEJA: Simão Robson Jatene Governador do Pará: "A divisão do Pará não é uma panaceia".Embora tenha prometido se manter neutro no plebiscito que propõe a divisão do estado, o governador do Pará resolveu se posicionar: É contra...
Até o meio de novembro, o governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), estava decidido a manter-se neutro diante do plebiscito que pode dar início à divisão do estado e à criação de Tapajós e Carajás. Mas depois que assistiu na televisão uma peça publicitária criada por Duda Mendonça para a campanha do "sim", mudou de ideia. “Achei a campanha muito agressiva e decidi me posicionar”.
Nesta entrevista, concedida há uma semana na Secretaria de Ciência e Tecnologia do Pará, no centro de Belém, Jatene explica os motivos que o levaram a declarar-se contrário à divisão do estado e revela que está receoso com a votação de 11 de dezembro. Segundo ele, o plebiscito pode gerar confrontos entre a população. O governador também chama a atenção para a falta de informação que atinge o eleitorado. "Não há estudos que embasem o voto do povo", afirma. Confira os melhores trechos da entrevista.
O senhor vai votar no “sim” ou no “não”? Sempre digo que mais complicado do que uma resposta errada é uma pergunta errada. O que todo o país deveria se questionar era: o que significa isso? Mais do que a pergunta sobre o sim e o não, precisamos saber o que está acontecendo para que esse e outros projetos de divisão territorial estejam postos no Congresso Nacional (hoje, existem 14 projetos de divisão territorial em tramitação no Congresso). No caso do Pará, eu digo que, como governador, estou mais preocupado com o dia seguinte à votação. Seja qual for o resultado, a chance de guardarmos mágoas e ressentimentos é muito alta.
Por que existem tantos projetos de divisão territorial em tramitação no Congresso? Para mim tem uma explicação clara: o pacto federativo não comporta as necessidades e demandas da própria sociedade. Em outras palavras, os direitos e deveres atribuídos aos estados não estão balanceados o suficiente para que eles sejam capazes de responder às demandas da sociedade. Isso acaba criando no imaginário das pessoas a necessidade de buscas de alternativas que supostamente levem à melhoria da sua qualidade de vida.
Por que saúde, segurança e educação são tão frágeis nos municípios paraenses? Os estados têm hoje uma sobrecarga de responsabilidades, mas não têm dinheiro nem mecanismos para cumpri-las.
O senhor acha que a divisão do estado ajudaria no combate à pobreza e à miséria? Quem pode saber? Ninguém. Sou capaz de argumentar tanto que a divisão pode contribuir, quanto que pode não contribuir. O problema é que a população está sendo empurrada para decidir sobre uma coisa sem que tenha os elementos objetivos para fazer isso, completamente desinformada. E aí entram os ressentimentos, as mágoas, as feridas. Você põe a população em confronto.
Que consequências a divisão do Pará traria para o estado? Não é possível saber isso. Como posso saber se os estados terão ganhos ou perdas? Precisaria de uma bola de cristal. E aí, para decidir isso, é feita uma pergunta que parece muito simples: “sim ou não”? A população dá o pontapé inicial, mas quem decide, depois do plebiscito, é o Congresso e a presidente da República. A ideia só vai adiante se a decisão for pela divisão. Se o resultado do plebiscito for “não”, é terminativo. Se for “sim”, vai passar pelo Congresso e pela presidente. Como ficam as pessoas que foram instadas a se manifestar e lhes foi dado o indicativos de que elas estariam decidindo sobre uma coisa que no fundo não decidem? Isso é grave, é muito sério. A Europa está cheia de experiências dramáticas de lutas internas de natureza religiosa, étnica, que geram cicatrizes curam.
O senhor acha que o plebiscito pode gerar um conflito? Você tem acompanhado a campanha na televisão? A campanha vinha numa crescente que parecia que estava dada a largada para o vale-tudo. Uma das peças, que mais me chocou, dizia que as misérias e as desgraças do estado eram como um tapa na cara do paraense, e então aparecia uma mão dando um tapa no rosto do eleitor. A questão da pobreza não é uma questão de território, é algo muito complexo para reduzir a uma questão de disputa de território. A minha preocupação é que a luta para a divisão do território termine contribuindo para dividir o povo.
Na opinião do senhor, a quem interessa dividir o estado? Existe no país um sentimento de incapacidade dos estados de responder às demandas da população. Isso, na minha opinião, é a raiz desses projetos separatistas. Esse terreno permite que existam grupos ou interesses que se aproveitem dessa situação e tentem transformar seus interesses em desejos da população. O que o povo quer, aqui ou em qualquer lugar, é mais saúde, educação, segurança, emprego e renda. E aí apontam a divisão do Pará como uma panaceia. Isso não é verdadeiro.
O senhor pretende gravar alguma propaganda contra a divisão do estado? Não. Acho que não devo contribuir com campanha nenhuma justamente para ter um dia seguinte menos traumático. Eu gravaria todas as propagandas para dizer o seguinte: o plebiscito não é tão simples quanto está posto, temos que ter muito cuidado no sentido de que essa questão da divisão territorial não gere a nossa divisão enquanto povo.
Se houvesse a divisão, o senhor acha que haveria melhora em saúde e segurança, por exemplo? Estaria sendo leviano se garantisse isso ou aquilo. Eu me considero uma pessoa bem informada, com razoável acesso à informação e um certo grau de conhecimento da economia, da sociedade, mas acho que é absolutamente precipitado e inconsistente afirmar que haveria melhoras. O que temos sabemos é que haverá um crescimento das despesas, com tribunais, assembleias, quarteis, etc. Como se financia isso? Não sabemos. São muitas incertezas.
O plebiscito é precipitado? O processo de divisão de um estado precisa ter elementos. É necessária uma discussão que preceda o plebiscito, com a apresentação desse projeto para o povo, por meio de audiências públicas. Aí será um projeto concreto no qual a população deixa de ser um apêndice e passa a ser protagonista.
O senhor acha que tirar do Pará o território que corresponde a Tapajós, uma região que produz pouco e gera despesas, deixaria o estado mais livre para se desenvolver? Não. Tapajós produz uma coisa fantástica que não é reconhecida nacionalmente. Você não acha que preservar floresta e rio na Amazônia é uma riqueza para o planeta? Qual é o conceito de desenvolvimento? Temos que compreender que a diversidade e a pluralidade são elementos constitutivos de riqueza.
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